sábado, 25 de dezembro de 2010

Retrospectiva 2010: Espanha se consagra na Copa do Mundo com futebol 'a la Barça'

A Espanha, finalmente, chegou lá. Foram décadas de derrotas, decepções, sonhos frustrados e, ironicamente, a Fúria precisou de uma base formada na Catalunha, no seio do Barcelonismo, para ganhar uma Copa do Mundo. O maior evento de 2010 acabou com o troféu em mãos ibéricas e a consagração de um jeito de ver e entender o futebol.

O que você vai ler agora ou clicando nas notícias abaixo faz parte de uma série de reportagens especiais produzidas pela equipe do ESPN.com.br, relembrando o que de melhor aconteceu no ano de 2010. Já revivemos a conquista mundial do vôlei, a Libertadores do Inter, que abriu uma discussão sobre o melhor clube brasileiro da década, as grandes lutas do MMA, o fracasso do trio-de-ferro paulista. E muito mais virá pela frente nos próximos dias.

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A Copa do Mundo na África não foi um primor de organização. Entre obras inacabadas e problemas sociais e históricos jogados para baixo do tapete, no entanto, os sul-africanos conseguiram entregar ao mundo um "produto" interessante. As cores, a alegria de um povo que recentemente se livrou do Apartheid e, claro, as vuvuzelas marcaram o Mundial.

De problemas mais graves, o trânsito impressionante que fazia da vida dos torcedores e jornalistas um inferno para se aproximar dos estádios em dias de jogos; um mini caos aéreo que atrapalhou a logística nas semifinais - jogos fora de Johanesburgo, uma espécie de capital da Copa; e gramados castigados pelo frio e que tiveram que ser poupados durante o evento.

Em campo, o medíocre time da África do Sul até que empolgou a torcida e uniu brancos e negros, mas não conseguiu nem passar da primeira fase. Ficou para Gana a missão de ser o primeiro país africano a chegar a uma semifinal, mas o sonho esbarrou nos pênaltis contra o Uruguai. Itália e França, finalistas de 2006, escancararam crises incríveis e nem passaram para as oitavas. A Alemanha empolgou, goleou e tirou da Copa a Inglaterra, de Capello, e a Argentina, de Maradona, mas caiu nas semis contra a Espanha. E o Brasil, apesar de um time forte e bastante unido, sofreu uma pane no segundo tempo das quartas de final e foi eliminado pela Holanda.

Foi com um gol de Andrés Iniesta, já no finalzinho do segundo tempo da prorrogação, que a Espanha conseguiu derrotar os holandeses e levantar a taça Fifa naquele dia 11 de julho, com muito frio em Johanesburgo e quase 85 mil torcedores no Soccer City.

Dona de uma das ligas mais badaladas do mundo, com possivelmente os dois maiores clubes de futebol do planeta por tudo o que representam (Barcelona e Real Madrid), a Espanha nunca conseguia traduzir em resultados para sua seleção toda essa riqueza. A maldição acabava de vez. Depois do título da Eurocopa, em 2008, a Copa-2010 consagrava o país e a geração brilhante de jogadores.

Geração blaugrana

O destino da Espanha mudou depois da eliminação nas oitavas de final da Copa de 2006, quando o então técnico, Luís Aragonés, ganhou um voto de confiança para continuar no cargo e decidiu radicalizar.

Aragonés tirou de suas listas as "vacas sagradas" do futebol espanhol, jogadores como Raúl e Albelda, e decidiu montar a seleção em função do time que, já naquela época, melhor jogava futebol: o Barcelona. Foi com a base catalã, acrescida de talentos pontuais de outros times, que a Espanha forjou uma maneira bonita de jogar futebol, com muita posse de bola, passes precisos, marcação pressão e avançada.

A maldição de sempre cair nas quartas de final caiu em 2008, quando os espanhóis eliminaram a Itália da Eurocopa nos pênaltis. A partir dali, os jogadores passaram a acreditar que, além de jogar bem, podiam vencer. E passaram a fazer isso: vencer. Com um grupo fechado, alheio às pressões da imprensa pela convocação deste ou daquele, a Espanha quase não notou a troca de técnicos e a transição de Aragonés para o tranquilo Vicente del Bosque.

Um dos grandes nomes da história do Madridismo, Del Bosque fez questão de levar a sério a máxima do "em time que está ganhando, não se mexe", manteve a base blaugrana, e a filosofia do Barcelona se enraizou na Fúria. "Vamos dar sequência ao trabalho", dizia, ao assumir. A seleção convocada para a Copa do Mundo foi muito parecida com a da Eurocopa e a maior parte das mudanças aconteceu por motivos físicos, não técnicos ou filosóficos.

No total, oito jogadores do Barcelona foram convocados para a "Missão África". O grupo ainda tinha Cesc Fábregas, formado na cantera blaugrana, e jogadores de outros times, mas estilos parecidos: gente com o volante Xabi Alonso, do Real Madrid, o meia David Silva, do Valencia, e os jovens "pontas" Mata, também do Valencia, e Jesús Navas, do Sevilla.

Em relação ao time titular de 2008, somente três mudanças. O zagueiro Piqué no lugar do veterano Marchena. No meio de campo, o jovem Busquets ocupou o lugar do hispano-brasileiro Marcos Senna. Sabendo que Busquets não conseguiria combater como volante único, ele tirou David Silva e acrescentou um marcador (com ótima qualidade no passe, logicamente) no time: Xabi Alonso. A quarta mudança viria na semi e na final, com Pedro no lugar de Fernando Torres, pela má forma do atacante do Liverpool.

Campanha

Ironicamente, apesar do estilo Barcelona de ver e jogar futebol, foi tomando poucos gols que a Espanha chegou ao título mundial. Nunca antes um país havia ficado toda a fase de mata-mata, das oitavas à final, sem levar um gol sequer.

A estreia foi trágica. No dia 16 de junho, em Durban, a Espanha perdeu para a Suíça por 1 a 0 - somente a segunda derrota desde a Euro-2008. Aquele momento, no entanto, foi decisivo. O time não havia jogado mal, havia criado chances de gol e a derrota era circunstancial. Del Bosque juntou seus jogadores e eles decidiram não fazer mudanças radicais. O estilo que havia dado certo até então não poderia ser modificado, a decisão foi pela manutencão do jeito de jogar.

Foi no segundo jogo, dia 21 de junho, no gelado estádio Ellis Park (Johanesburgo), que a Espanha conseguiu superar Honduras por 2 a 0, com dois gols de Villa, que ainda perderia um pênalti. Em relação ao time da estreia, Del Bosque promoveu a entrada de Fernando Torres no onze titular no lugar de Iniesta, que passava por dificuldades físicas, além de Jesús Navas no lugar de David Silva.

Apesar da vitória, depois daquele jogo vieram as principais críticas de Del Bosque ao time. "Não gostei. Atuamos de forma dispersa, não estivemos juntos no campo e demos sopa para o azar", disse o técnico, ainda no estádio.

No dia 25 de junho, em Pretória, a Espanha fazia sua primeira final. Precisava ganhar do bom time do Chile sob o risco de ser eliminada na primeira fase ou de ser segunda do grupo H, tendo que pegar o Brasil logo nas oitavas. Iniesta voltou ao time no lugar de Jesús Navas, e Del Bosque levou a campo a formação que considerava ideal: Busquets, Xabi Alonso, Xavi e Iniesta no meio, com Villa e Torres à frente. Villa e Iniesta fizeram os gols da vitória de 2 a 1 e da classificação, mas Fernando Torres voltou a jogar mal e demonstrar que não estava bem fisicamente.

O time foi mantido para o duelo ibérico de oitavas de final, dia 29 de junho, na Cidade do Cabo, contra Portugal. Foi uma das melhores partidas da Espanha, que esbarrou em atuação fantástica do goleiro português Eduardo e só furou a retranca aos 17 do segundo tempo, com o quarto gol de Villa no Mundial.

O duelo contra o Paraguai, nas quartas de final, prometia ser fácil e acabou ganhando contornos dramáticos. No dia 3 de julho, no Ellis Park, Del Bosque mandou a campo seu time ideal pela terceira vez seguida - e também a última. Com uma marcação implacável, o Paraguai não só anulou a Espanha no primeiro tempo como teve um gol anulado. Na etapa final, os paraguaios tiveram um pênalti, mas Casillas defendeu a cobrança de Cardozo.

Logo depois, foi a Espanha que teve um pênalti a seu favor. Xabi Alonso cobrou bem, mas o árbitro mandou voltar e, na segunda oportunidade, o volante parou no goleiro Villar. Somente aos 37 minutos do segundo tempo, após uma jogada fantástica de Iniesta, Villa marcaria para garantir a Espanha nas semifinais.

O duelo do dia 7 de julho, em Durban, era contra a sensação da Copa, a Alemanha, que chegava após goleadas de 4 a 1 na Inglaterra e 4 a 0 na Argentina, mas sem seu grande nome no Mundial, o jovem atacante Thomas Muller (suspenso). Diante das atuações apagadas de Fernando Torres, Del Bosque promoveu a entrada do jovem Pedro, do Barcelona, deixando Villa sozinho à frente e dando ainda mais liberdade para Xavi e Iniesta.

Foi na semifinal que a Espanha fez seu grande jogo no Mundial, lembrando os melhores momentos do Barcelona. Sufocou a Alemanha do começo ao fim, não deixando o rival confortável em campo em nenhum momento, tomando conta da posse de bola e criando muitas chances de gol. Foi só aos 26 do segundo tempo e depois de muita pressão que o zagueirão Puyol apareceu com a enorme cabeleira para cabecear e decretar mais um 1 a 0 de ouro para os espanhóis.

Decisão e glória

11 de julho, Soccer City. A Espanha foi a campo para sua primeira final de Copa do Mundo com o mesmíssimo time que havia vencido a Alemanha na semi. A defesa de todo Mundial, com Casillas, Sergio Ramos, Puyol, Piqué e Capdevilla. O meio formado por Busquets, Xabi Alonso, Xavi e Iniesta. E o ataque de Villa e Pedro. Nada menos do que sete jogadores do Barcelona, seis deles formados pelo próprio clube - a exceção era o artilheiro Villa, recém-contratado junto ao Valencia.

Espanha e Holanda eram as seleções europeias de melhor desempenho dos últimos dois anos, e a vencedora seria a primeira a ganhar uma Copa do Mundo fora do Velho Continente. Foi a final mais violenta da história, com 13 cartões amarelos e 1 vermelho mostrados pelo inglês Howard Webb - meses depois, ele diria que se arrependia de não ter expulsado algum holandês antes.

A seleção laranja abusou das faltas para quebrar o ritmo da Espanha e, ainda assim, só não ganhou o jogo porque Arjen Robben perdeu duas chances claras de gol diante de Casillas. De tanto correr atrás, a Holanda cansou. Na prorrogação, com Fábregas, Jesús Navas e Fernando Torres em campo, a Espanha começou a criar uma chance após a outra - coube ao iluminado Iniesta, após passe açucarado de Fábregas (outra cria blaugrana), fazer o gol do título e virar herói nacional.

Del Bosque, sempre discreto, dividiu seus méritos com o antecessor, Luís Aragonés. Da África, os espanhóis partiram com a Copa levantada por Casillas para carreatas e mais carreatas em seus país. Neste fim de ano, a mensagem de Feliz Natal do Rei Juan Carlos continha nada menos do que uma foto dos campeões do mundo.

Em um 2010 de forte crise econômica e desemprego recorde na Espanha, o país viveu sua maior glória esportiva. A Copa do Mundo consagrou um jeito de ver futebol. Um jeito que quase todos gostam.

Números da Copa de 2010:

Times com mais jogadores: Barcelona (13), Chelsea (12), Liverpool (12)
Ligas com mais jogadores: Inglaterra (117), Alemanha (84)
Total de jogos: 64
Total de gols: 145 (2,27 por partida)
Público total: 3.178.856 espectadores
Média de público: 49.670 por jogo
Artilheiros: Forlán (URU), Muller (ALE), Sneijder (HOL) e Villa (ESP), com 5 gols
Melhor jogador (Bola de Ouro): Diego Forlán (URU)
Time ideal (votação do público): Casillas (ESP); Maicon (BRA), Ramos (ESP), Puyol (ESP) e Lahm (ALE); Schweinsteiger (ALE), Xavi (ESP), Iniesta (ESP) e Sneijder (HOL); Villa (ESP) e Forlán (URU)

Campanha da Espanha:

16/6/10, Durban: Espanha 0 x 1 Suíça
21/6/10, Johanesburgo: Espanha 2 x 0 Honduras (Villa 2)
25/6/10, Pretória: Espanha 2 x 1 Chile (Villa, Iniesta)
29/6/10, Cidade do Cabo: Espanha 1 x 0 Portugal (Villa)
3/7/10, Johanesburgo: Espanha 1 x 0 Paraguai (Villa)
7/7/10, Durban: Espanha 1 x 0 Alemanha (Puyol)
11/7/10, Johanesburgo: Espanha 1 x 0 Holanda (Iniesta, prorrogação)

Elenco campeão do mundo:

1 Iker Casillas (goleiro, Real Madrid)
2 Raúl Albiol (zagueiro, Real Madrid)
3 Gerard Piqué (zagueiro, Barcelona)
4 Carlos Marchena (zagueiro, Valencia)
5 Carles Puyol (zagueiro, Barcelona)
6 Andrés Iniesta (meia, Barcelona)
7 David Villa (atacante, Valencia)
8 Xavi (meia, Barcelona)
9 Fernando Torres (atacante, Liverpool)
10 Cesc Fábregas (meia, Arsenal)
11 Joan Capdevila (lateral, Villarreal)
12 Víctor Valdés (goleiro, Barcelona)
13 Juan Manuel Mata (atacante, Valencia)
14 Xabi Alonso (volante, Real Madrid)
15 Sergio Ramos (lateral, Real Madrid)
16 Sergio Busquets (volante, Barcelona)
17 Álvaro Arbeloa (lateral, Real Madrid)
18 Pedro (atacante, Barcelona)
19 Fernando Llorente (atacante, Athletic Bilbao)
20 Javi Martínez (volante, Athletic Bilbao)
21 David Silva (meia, Valencia)
22 Jesús Navas (atacante, Sevilla)
23 Pepe Reina (goleiro, Liverpool)

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